A diminuição do número de refeições realizadas em casa, a necessidade de se alimentar em um curto espaço de tempo, o consumo de alimentos de preparação rápida como a rede fast food (com alta densidade calórica e baixo poder sacietógeno) e a redução do nível diário de atividade física – sedentarismo- contribuiu para uma prevalência cada vez maior da obesidade no Brasil e no mundo. Nesse contexto, a obesidade é reconhecida como uma doença crônica, heterogênea e multifatorial, que necessita ser tratada, dada a associação com outras doenças graves e o impacto negativo na qualidade e expectativa de vida dos indivíduos obesos.
O tratamento da obesidade, no entanto, é complexo e muito abrangente. Cada paciente deve ser avaliado sobre a sua história de ganho de peso e os problemas de saúde/dificuldades dele advindos. Inicialmente é preciso conscientizá-lo da necessidade de modificação dos seus hábitos de vida, como a redução das calorias ingeridas e o início da atividade física. O apoio social e familiar são fundamentais nesse processo. A terapia farmacológica com medicações antiobesidade pode ser prescrita após análise cuidadosa do paciente, incluindo seu padrão alimentar, comorbidades associadas e ausência de contraindicações.
Entretanto, muitas vezes essas medidas não são suficientes para se obter o controle desejado do peso. Indubitavelmente, das opções terapêuticas de que dispomos atualmente, a cirurgia bariátrica e metabólica (termo mais adequado dado os benefícios metabólicos além da perda ponderal) é a ferramenta mais eficaz em promover a perda do excesso de peso corporal, e o aperfeiçoamento de suas técnicas evoluiu consideravelmente nos últimos anos, minimizando os riscos e complicações inerentes à cirurgia.
Por outro lado, o paciente precisa estar consciente da necessidade de seguimento pós-operatório a longo prazo, pois os efeitos da cirurgia no trato gastrintestinal levam também à redução da ingestão e absorção de vitaminas (Vit. D, B12) e minerais (cálcio, ferro), podendo ocasionar complicações sérias como anemia de difícil controle, osteoporose grave com fraturas e desnutrição proteica se não forem repostas adequadamente. O uso de suplementos vitamínico-minerais e a reposição isolada de alguns micronutrientes deve ser permanente após a cirurgia. O acompanhamento pós-operatório com médico endocrinologista para ajuste dessas reposições é fundamental.
Além disso, as mudanças físicas, comportamentais e psicológicas que se seguem precisam ser “encaradas” pelo paciente. Logo após a cirurgia, o hábito alimentar muda completamente, os primeiros dias são baseados apenas em dieta líquida, que vai sendo progressivamente substituída por dieta pastosa e depois sólida, tudo sob orientação cuidadosa do nutricionista da equipe. Junto a isso, a rápida perda de peso e mudanças na imagem corporal são aspectos importantes que exigem comportamentos adaptativos do paciente e, em geral, são bem enfrentados quando o paciente dispõe e faz uso de uma equipe de suporte multiprofissional contendo, além do endocrinologista, nutricionista e psicólogo.
Outro aspecto que pode acontecer no pós-operatório é o reganho do peso corporal. Este é um dos maiores receios dos pacientes que desejam a cirurgia. Em geral, o paciente perde peso progressivamente até 12 a 18 meses após a operação, com estabilização do peso após 2 anos, em média, quando o reganho pode acontecer. É preciso saber que a perda de peso no pós-operatório não significa a cura da obesidade e esta, como qualquer outra doença crônica, pode recidivar ao longo do tempo. Por essa razão, o tratamento permanente com equipe multidisciplinar é essencial, reforçando ações de combate a hábitos não saudáveis e oferecendo suporte e educação continuada ao paciente.
Portanto, a decisão quanto à realização de cirurgia bariátrica deve ser cuidadosa e feita em conjunto com endocrinologista, cirurgião e equipe multidisciplinar. A ansiedade pela cirurgia e pelos seus resultados é extremamente natural e compreensível, mas é preciso ter em mente todos esses aspectos. A cirurgia não é milagrosa, mas funciona muito bem desde que a indicação, a avaliação e o seguimento sejam feitos por uma equipe competente e com experiência no manejo desses pacientes.
Autora: Dra. Marília Cardoso